domingo, 9 de setembro de 2012

Reclamante ajuiza reclamatória trabalhista contra ex-marido e é condenada como litigante de má-fé

Um caso bastante curioso foi julgado pelo Juiz do Trabalho Diogo Souza da 6ª Vara do Trabalho de Porto Alegre-RS. Inclusive a sentença foi destaque na Revista Eletrônica do TRT4 nº 144/2012.
A reclamatória em comento foi ajuizada por uma mulher, que postulava o reconhecimento de vínculo empregatício de um período de quase dez anos, com função inicial de secretária e final de auxiliar de saúde bucal e técnica em saúde bucal. Ainda, a reclamante reclamou os direitos trabalhistas decorrentes do reconhecimento da relação de emprego, tais como FGTS, férias, gratificações natalinas, multas diferenças salariais, etc...
Parecia se tratar de uma reclamatória comum. Contudo, a contestação noticiou fatos omitidos pela reclamante que comprometeram o êxito da tese da autora. O reclamado, uma pessoa física, argumentou que a reclamante, na verdade, era sua esposa e que nunca lhe prestou serviços, muito menos mediante relação de emprego. Cumpre citar trecho do relatório da sentença que sintetiza a tese da defesa: 

O reclamado contesta o pedido, alegando que a reclamante jamais foi sua empregada, mas companheira, em razão de união estável mantida entre as partes, extinta em meados de agosto de 2010. Salienta, ainda, que a reclamante busca locupletamento em contrapartida à ação de dissolução de união estável que tramita na Vara de Família e Sucessões. Refere, outrossim, que desde 2001 manteve união estável com a reclamante e durante o relacionamento do casal jamais houve fatos caracterizadores de relação de emprego, pois nunca houve labor, subordinação ou desigualdade entre as partes. Esclarece que a autora foi pega em adultério e não se conforma com a separação, ressaltando que se estivesse de fato trabalhando não teria tempo para estar com outras pessoas. Da mesma forma, relata fatos ocorridos no curso da relação conjugal que culminaram com a ação de dissolução de união estável. Em razão dos fatos expostos, requer a improcedência da ação, bem como seja a reclamante reputada litigante de má-fé, com aplicação das penalidades pertinentes. 

A ação foi julgada improcedente, e o Juiz fundamentou sua decisão com base na farta prova documental constante nos autos. Ainda, o Julgador destacou na sentença “que a petição inicial omite deliberadamente que no período discutido nos autos as partes mantiveram relação amorosa”.
O Juiz desconsiderou os documentos trazidos aos autos pela reclamante, que foram impugnados pelo reclamado, e entendeu não existir prova de quem os tenha confeccionado, visto que tais documentos são de fácil manipulação, encontrados em qualquer papelaria.
Foi ressaltado na sentença que as declarações de imposto de renda do reclamado demonstram que a autora era sua dependente, ou seja, não exercia qualquer atividade remunerada, o que, por si só, impede o reconhecimento da alegada relação de emprego.
Ainda, o Juiz entendeu que mesmo que fosse admitida a prestação de serviços pela reclamante no consultório do reclamado, tal ocorreu com intuito de benefício do casal, pois o resultado econômico revertia em prol da família da qual a autora era participante, e que o rompimento da relação afetiva não autorizaria concluir que o trabalho porventura prestado pela reclamante deva ser retribuído na forma de reconhecimento da relação de emprego.
Ou seja, o Juiz entendeu que se tratava de uma relação gratuita de natureza familiar, que envolve deveres recíprocos de cooperação e de mútuo suporte, não apenas material, mas também afetivo, sem qualquer traço de subordinação econômica.
Como se não bastasse, o Juiz ainda ressaltou que a Justiça do Trabalho não serve para resolver problemas conjugais, senão vejamos o seguinte trecho da sentença: 

Ressalto, também, que as questões trazidas aos autos demonstram elementos estranhos a uma ação trabalhista comum, uma vez que as partes expuseram de forma desnecessária sua vida pessoal, demonstrando o caráter emocional e afetivo da relação mantida entre as partes.
Destaco, por necessário, que as questões de tal natureza deverão ser resolvidas na Vara de Família, nos autos do processo que lá tramita, não se prestando esta Especializada para resolver problemas conjugais. Ademais, a Justiça do Trabalho não deve ser utilizada como meio de contra ataque à ação ajuizada pelo reclamado na Justiça Comum, com o único intuito de buscar enriquecimento sem causa, intenção evidenciada nestes autos.
Ora, os fatos relatados pelas partes na ação cível revela que houve de tudo um pouco nesses nove anos de relacionamento, menos relação de emprego.

A reclamante foi declarada litigante de má-fé e condenada a pagar multa em favor do réu, bem como honorários advocatícios de 20% para a advogada do reclamado.
A autora recorreu da sentença e os autos já estão no Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, e a relatoria ficou a cargo de uma mulher, a desembargadora Ana Luiza Heineck Kruse, da 1ª Turma.
Será que a reclamante conseguirá reverter a decisão de 1º grau?

Processo trabalhista nº 0000417-16.2011.5.04.0006

O reclamado foi defendido por uma mulher, a advogada Dra. Nara Pereira de Oliveira, OAB/RS nº 67536

Maiores informações podem ser obtidas no site www.trt4.jus.br e na Revista Eletrônica do TRT4 nº 144, disponível em: http://www.trt4.jus.br/portal/portal/trt4/consultas/jurisprudencia/revistaeletronica