Um
caso bastante curioso foi julgado pelo Juiz do Trabalho Diogo Souza da 6ª Vara
do Trabalho de Porto Alegre-RS. Inclusive a sentença foi destaque na Revista
Eletrônica do TRT4 nº 144/2012.
A
reclamatória em comento foi ajuizada por uma mulher, que postulava o
reconhecimento de vínculo empregatício de um período de quase dez anos, com
função inicial de secretária e final de auxiliar de saúde bucal e técnica em
saúde bucal. Ainda, a reclamante reclamou os direitos trabalhistas decorrentes
do reconhecimento da relação de emprego, tais como FGTS, férias, gratificações
natalinas, multas diferenças salariais, etc...
Parecia
se tratar de uma reclamatória comum. Contudo, a contestação noticiou fatos
omitidos pela reclamante que comprometeram o êxito da tese da autora. O
reclamado, uma pessoa física, argumentou que a reclamante, na verdade, era sua
esposa e que nunca lhe prestou serviços, muito menos mediante relação de
emprego. Cumpre citar trecho do relatório da sentença que sintetiza a tese da
defesa:
O
reclamado contesta o pedido, alegando que a reclamante jamais foi sua empregada,
mas companheira, em razão de união estável mantida entre as partes, extinta em
meados de agosto de 2010. Salienta, ainda, que a reclamante busca
locupletamento em contrapartida à ação de dissolução de união estável que
tramita na Vara de Família e Sucessões. Refere, outrossim, que desde 2001
manteve união estável com a reclamante e durante o relacionamento do casal
jamais houve fatos caracterizadores de relação de emprego, pois nunca houve
labor, subordinação ou desigualdade entre as partes. Esclarece que a autora foi
pega em adultério e não se conforma com a separação, ressaltando que se
estivesse de fato trabalhando não teria tempo para estar com outras pessoas. Da
mesma forma, relata fatos ocorridos no curso da relação conjugal que culminaram
com a ação de dissolução de união estável. Em razão dos fatos expostos, requer
a improcedência da ação, bem como seja a reclamante reputada litigante de
má-fé, com aplicação das penalidades pertinentes.
A
ação foi julgada improcedente, e o Juiz fundamentou sua decisão com base na
farta prova documental constante nos autos. Ainda, o Julgador destacou na
sentença “que a petição inicial omite deliberadamente que no período discutido
nos autos as partes mantiveram relação amorosa”.
O
Juiz desconsiderou os documentos trazidos aos autos pela reclamante, que foram impugnados
pelo reclamado, e entendeu não existir prova de quem os tenha confeccionado,
visto que tais documentos são de fácil manipulação, encontrados em qualquer
papelaria.
Foi
ressaltado na sentença que as declarações de imposto de renda do reclamado
demonstram que a autora era sua dependente, ou seja, não exercia qualquer
atividade remunerada, o que, por si só, impede o reconhecimento da alegada
relação de emprego.
Ainda,
o Juiz entendeu que mesmo que fosse admitida a prestação de serviços pela
reclamante no consultório do reclamado, tal ocorreu com intuito de benefício do
casal, pois o resultado econômico revertia em prol da família da qual a autora
era participante, e que o rompimento da relação afetiva não autorizaria
concluir que o trabalho porventura prestado pela reclamante deva ser retribuído
na forma de reconhecimento da relação de emprego.
Ou
seja, o Juiz entendeu que se tratava de uma relação gratuita de natureza
familiar, que envolve deveres recíprocos de cooperação e de mútuo suporte, não
apenas material, mas também afetivo, sem qualquer traço de subordinação
econômica.
Como
se não bastasse, o Juiz ainda ressaltou que a Justiça do Trabalho não serve para
resolver problemas conjugais, senão vejamos o seguinte trecho da sentença:
Ressalto,
também, que as questões trazidas aos autos demonstram elementos estranhos a uma
ação trabalhista comum, uma vez que as partes expuseram de forma desnecessária
sua vida pessoal, demonstrando o caráter emocional e afetivo da relação mantida
entre as partes.
Destaco,
por necessário, que as questões de tal natureza deverão ser resolvidas na Vara
de Família, nos autos do processo que lá tramita, não se prestando esta
Especializada para resolver problemas conjugais. Ademais, a Justiça do Trabalho
não deve ser utilizada como meio de contra ataque à ação ajuizada pelo
reclamado na Justiça Comum, com o único intuito de buscar enriquecimento sem
causa, intenção evidenciada nestes autos.
Ora,
os fatos relatados pelas partes na ação cível revela que houve de tudo um pouco
nesses nove anos de relacionamento, menos relação de emprego.
A
reclamante foi declarada litigante de má-fé e condenada a pagar multa em favor
do réu, bem como honorários advocatícios de 20% para a advogada do reclamado.
A
autora recorreu da sentença e os autos já estão no Tribunal Regional do Trabalho
da 4ª Região, e a relatoria ficou a cargo de uma mulher, a desembargadora Ana
Luiza Heineck Kruse, da 1ª Turma.
Será que a reclamante conseguirá
reverter a decisão de 1º grau?
Processo
trabalhista nº 0000417-16.2011.5.04.0006
O
reclamado foi defendido por uma mulher, a advogada Dra. Nara Pereira de
Oliveira, OAB/RS nº 67536
Maiores
informações podem ser obtidas no site www.trt4.jus.br
e na Revista Eletrônica do TRT4 nº 144, disponível em: http://www.trt4.jus.br/portal/portal/trt4/consultas/jurisprudencia/revistaeletronica