quinta-feira, 16 de maio de 2013

O ADVOGADO EMPREGADO E SEU PISO SALARIAL


A advocacia é o foco de muitos debates, e no contexto trabalhista os direitos do advogado empregado suscitam muitas dúvidas.
O Estatuto da Advocacia, regulamentado pela Lei nº 8.906/94, garante ao advogado empregado direitos trabalhistas.
Antes da Lei nº 8.906/94, o Estatuto da Advocacia estava regulamentado pela Lei n° 4.215/63, diploma este que não falava em advogado empregado, porque naquele tempo predominava a tradicional advocacia de partido, em uma época com diferentes aspectos econômicos e financeiros, e que contava com número expressivamente menor de advogados no mercado, haja vista até mesmo uma litigiosidade menos intensa.
Todavia, como sabemos, nosso país cresceu e evoluiu de um país agrícola para uma das nações mais industrializadas, com drásticas mudanças na economia e na sociedade. Como consequência, o modo de se exercer a advocacia mudou: o número de profissionais aumentou e a demanda de trabalho ficou maior e mais complexa, o que levou muitos advogados e escritórios, com expressiva carteira de clientes e processos, a contratarem outros advogados para trabalharem no âmbito de seus escritórios.
Ou seja, aquele antigo cenário, do causídico autônomo, que trabalha em seu escritório, de forma artesanal, atendendo os mesmos clientes de sempre, mudou para a era das grandes bancas, e que na maioria dos casos atuam em ações de massa, o que exige muita mão de obra.



Nesse sentido, Adriana Siqueira Galvão [1] muito bem analisa a situação:

A figura do advogado empregado não é nova. Seu perfil foi sendo esboçado com a expansão das corporações industriais, inevitavelmente refletido em outros setores da atividade empresarial secundária ou terciária, estas últimas aninhando o exercício das profissões liberais. Neste último século, de modo especial após o grande conflito armado de 1939/45, a prática das profissões liberais, consideradas socialmente nobres em sua origem, como era o caso, sobretudo, da medicina e da advocacia, foi sendo mais e mais sufocada pelas dificuldades econômicas para a formação e para a montagem da infra-estrutura fundamental ao próprio exercício. A concorrência exacerbada do mercado, provinda, em parte, da multiplicação de cursos habilitantes, de qualidade habitualmente duvidosa e, em outra parte, do oferecimento de melhores condições de aperfeiçoamento sob o patrocínio interessado das empresas, a sensação de segurança irradiada por sua estrutura econômica e pela assistência social prestada, foram impelindo os profissionais liberais de sua posição originária de trabalhadores autônomos para a de subordinados. O desdobramento natural desse processo levou uma outra considerável porção desses profissionais liberais a organizar-se eles mesmos em bases empresariais, individualmente ou sob forma associativa, passando, então, a subordinar trabalhadores de sua própria qualificação, como empregados”.

Ou seja, muitas sociedades de advogados necessitam contar com o trabalho permanente de outros advogados nas suas atividades habituais, sendo comum que as bancas jurídicas se organizem tal como grandes empresas, posto que precisam contar com quadro organizado de funcionários (secretários, auxiliares, estagiários, advogados, etc...).
Ainda, muitas empresas de diversos segmentos (indústria, comércio, serviços...) possuem departamentos jurídicos internos, com advogados empregados contratados, para trabalharem com medidas preventivas, elaboração de contratos, comparecimento em órgãos públicos para diligência, prestando consultoria e assessoria jurídica, bem como outras atividades jurídicas.
De acordo com o jurista Paulo Luiz N. Lobo, a previsão da figura do advogado empregado no Estatuto da Advocacia “é o reconhecimento legal a um fenômeno que se tornou predominante na advocacia brasileira", visto que o Estatuto anterior tinha como modelo o advogado autônomo, que não se subordinava como empregado aos seus clientes. [2]
No mesmo sentido, cumpre destacar o comentário de Carlos Roberto Faleiros Diniz [3] sobre o tema:


“O contingente de advogados que todos os anos se insere no mercado de trabalho fez com que o campo de atividades dos mais novos ficasse restrito. Os muitos advogados, que anteriormente direcionavam-se ao ministério privado, montando seus escritórios e realizando atividades por sua conta e risco, passaram a defender a administração pública, como um todo, instituições financeiras, sociedades comerciais, indústrias e empresas de todos os ramos, e com eles estabelecer relação empregatícia, tornando-se advogados-empregados. Os advogados-empregados estão ligados a empresas que apresentam grande volume de demandas, e são contratados para assessorá-las, representaá-las e defender seus interesses, já que delas são emrpegados.
Diante dessa nova situação, o próprio legislador, reconheceu o cenário, e trouxe inestimáveis inovações na disciplina do exercício da atividades profissional, designando um capítulo inteiro para regular a atividade do advogado-empregado (EAOAB, Cap. V, art. 18 a 21)”.


Infelizmente, na prática, muitos escritórios de advocacia contratam advogados para trabalharem em suas bancas sem formalizar a contratação. É muito comum os profissionais trabalharem sem nenhuma espécie de vinculação, em total afronta às disposições constantes no Estatuto da Advocacia e na Consolidação das Leis do Trabalho.

A remuneração do advogado empregado

Conforme o art. 19 do Estatuto da Advocacia, o salário mínimo profissional do advogado será fixado em sentença normativa, salvo se ajustado em acordo ou convenção coletiva de trabalho.
O inciso V do art. 7º da Constituição Federal garante como direito dos trabalhadores urbanos e rurais: “piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho”.
A remuneração mínima a ser paga ao advogado empregado deve observar o piso salarial da categoria, fixado mediante negociação coletiva ou conforme determinado por legislação específica, que pode ser estadual.
As horas extras do advogado empregado devem ser  remuneradas com um adicional não inferior a 100% sobre o valor da hora normal, mesmo havendo contrato escrito.
No cálculo das horas extras, se a jornada semanal contratada for de 20 horas, deve se utilizar o divisor 100. Caso a jornada semanal seja de 40 horas, o divisor 200 deve ser utilizado. Nesse sentido, é a súmula nº 431 do TST, in verbis:

Súmula nº 431 do TST
 SALÁRIO-HORA. EMPREGADO SUJEITO AO REGIME GERAL DE TRABALHO (ART. 58, CAPUT, DA CLT). 40 HORAS SEMANAIS. CÁLCULO. APLICAÇÃO DO DIVISOR 200 (redação alterada na sessão do tribunal pleno realizada em 14.09.2012) - Res. 185/2012,  DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012 
Para os empregados a que alude o art. 58, caput, da CLT, quando sujeitos a 40 horas semanais de trabalho, aplica-se o divisor 200 (duzentos) para o cálculo do valor do salário-hora.

Ainda, sobre o divisor para cálculo do salário-hora, cumpre citar recente julgado do TST, referente a um advogado empregado:

“[...] SALÁRIO-HORA. 40 HORAS SEMANAIS. CÁLCULO. APLICAÇÃO DO DIVISOR 200. "Aplica-se o divisor 200 (duzentos) para o cálculo do valor do salário-hora do empregado sujeito a 40 (quarenta) horas semanais de trabalho". Este é o teor da Súmula 113 do TST, em desacordo com a qual foi proferido o acórdão do Tribunal Regional. [...]2.1. SALÁRIO-HORA. ADVOGADO. JORNADA DE QUATRO HORAS. DIVISOR Segundo se constata do acórdão recorrido, está incontroverso que o recorrente estava sujeito, ao cumprimento de jornada de trabalho de quatro horas. Assim, era de 20 horas sua carga horário semanal. A jurisprudência desta Corte assenta que ao advogado de Banco não se aplica a jornada prevista para os bancários, e nesse caso o sábado não é dia útil não trabalhado, mas dia de repouso semanal remunerado. A jurisprudência desta Corte, mediante a edição da Súmula 431, pacificou o entendimento no sentido de que: "431. SALÁRIO-HORA. EMPREGADO SUJEITO AO REGIME GERAL DE TRABALHO (ART. 58, CAPUT, DA CLT). 40 HORAS SEMANAIS. CÁLCULO. APLICAÇÃO DO DIVISOR 200 (redação alterada na sessão do tribunal pleno realizada em 14.09.2012) - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012 Para os empregados a que alude o art. 58, caput, da CLT, quando sujeitos a 40 horas semanais de trabalho, aplica-se o divisor 200 (duzentos) para o cálculo do valor do salário-hora." Portanto, decorre logicamente do verbete sumular deste Tribunal que o divisor aplicável à hipótese é o 100, tendo em vista estar o reclamante sujeito a uma carga horária de trabalho semanal com duração de vinte horas.DOU PROVIMENTO ao Recurso para determinar que, para efeito de cálculo do salário-hora do reclamante, seja aplicado o divisor 100.[...]” (TST, 5ª Turma, RR-610785-67.2004.5.12.0035, 17/04/2013)

Na questão da jornada de trabalho, considera-se como período de trabalho o tempo em que o advogado estiver à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, no seu escritório ou em atividades externas, sendo-lhe reembolsadas as despesas feitas com transporte, hospedagem e alimentação.
O advogado empregado que trabalhar no período das vinte horas de um dia até às cinco horas do dia seguinte terá as respectivas horas remuneradas como noturnas, acrescidas do adicional de 25%.
Conforme o art. 21 do Estatuto da Advocacia, nas causas em que for parte o empregador, ou pessoa por este representada, os honorários de sucumbência são devidos aos advogados empregados. Se o advogado for empregado de sociedade de advogados, os honorários de sucumbência são partilhados entre ele e a empregadora, na forma estabelecida em acordo.

O salário mínimo profissional do advogado empregado no Brasil

Na prática, o grande problema enfrentando pelos advogados empregados é que muitos estados brasileiros não possuem piso salarial mínimo para os advogados.
No mês passado o site jurídico Migalhas publicou em sua página uma relação dos pisos salariais existentes nos estados brasileiros. Segue abaixo copiada a tabela de pisos salariais divulgada pelo site Migalhas:

Estado
Piso salarial mensal (em R$) para advogados contratados
Tempo de inscrição na OAB
Regime de horas semanais
AC
1.600,00
-
-
1.600,00
-
-
DF
1.500,00
-
20h
2.100,00
-
40h
ES
4.010,61
4 a 5 anos
20h
3.285,07
2 a 4 anos
2.402,35
1 a 2 anos
1.200,00
-
20h
1.870,00
-
40h
MT
1.200,00
-
20h
1.800,00
-
40h
1.200,00
-
20h
2.000,00
-
40h
4.306,00
acima de 6 anos*
55h
3.212,00
acima de 4 anos*
2.184,00
acima de 2 anos*
1.640,00
0 a 2 anos*
2.047,58
-
-
RS
4.068,00
-
20h
1.600,00
-
20h
4.218,93
4 a 6 anos
20h
3.436,74
2 a 4 anos
2.813,95
1 a 2 anos
2.130,00
até 1 ano
*comprovação de exercício efetivo da advocacia no período
Fonte: Migalhas – www.migalhas.com.br

Conforme apurado pelo site Migalhas, outros estados brasileiros também já aguardam a aprovação de projetos de lei que estabeleçam um piso salarial: Ceará, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Rio Grande do Norte e Sergipe.
Apenas os pisos dos Estados do Rio de Janeiro e Piauí são impostos por lei.
Ainda, para melhor ilustrar e melhorar a análise do tema ora debatido, também é interessante verificar uma tabela de média salarial da área legal, divulgada pela Revista Exame, da editora Abril, que segue abaixo copiada:


Trabalhista
Pequeno porte
Médio Porte / Boutique
Grande Porte
(CLT)
Bônus
(CLT)
Bônus
(CLT)
Bônus
Advogado Júnior ( 1 a 3 anos)
2.500,00 - 3.200,00
0-2
3.100,00 - 4.500,00
0-3
3.000,00 - 4.200,00
0-3
Advogado Pleno ( 4 a 7 anos)
3.000,00 - 4.700,00
0-2
3.300,00 - 5.500,00
0-3
4.000,00 - 8.000,00
0-3
Advogado Sênior ( 7 a - anos)
4.500,00 - 10.000,00
0-2
6.000,00 - 10.500,00
0-3
6.000,00 - 12.000,00
0-3
Contencioso Cível
Pequeno porte
Médio Porte / Boutique
Grande Porte
(CLT)
Bônus
(CLT)
Bônus
(CLT)
Bônus
Advogado Júnior ( 1 a 3 anos)
2.800,00 - 4.500,00
0-2
3.300,00 - 5.000,00
0-3
3.000,00 - 5.500,00
0-3
Advogado Pleno ( 4 a 7 anos)
4.200,00 - 7.800,00
0-2
4.800,00 - 8.500,00
0-3
5.000,00 - 9.000,00
0-3
Advogado Sênior ( 7 a - anos)
7.500,00 - 10.000,00
0-2
8.000,00 - 11.000,00
0-3
8.800,00 - 13.000,00
0-3
Contencioso Tributário
Pequeno porte
Médio Porte / Boutique
Grande Porte
(CLT)
Bônus
(CLT)
Bônus
(CLT)
Bônus
Advogado Júnior ( 1 a 3 anos)
2.800,00 - 4.500,00
0-2
3.300,00 - 5.000,00
0-4
3.000,00 - 5.500,00
0-4
Advogado Pleno ( 4 a 7 anos)
4.200,00 - 7.800,00
0-2
4.800,00 - 8.500,00
0-4
5.000,00 - 9.000,00
0-4
Advogado Sênior ( 7 a - anos)
7.500,00 - 10.000,00
0-2
8.000,00 - 11.000,00
0-4
8.800,00 - 14.000,00
0-4
Consultivo Tributário
Pequeno porte
Médio Porte / Boutique
Grande Porte
(CLT)
Bônus
(CLT)
Bônus
(CLT)
Bônus
Advogado Júnior ( 1 a 3 anos)
3.500,00 - 5.000,00
0-2
3.500,00 - 5.000,00
0-4
3.800,00 - 6.000,00
0-5
Advogado Pleno ( 4 a 7 anos)
5.000,00 - 7.500,00
0-2
5.000,00 - 9.500,00
0-4
6.000,00 - 11.000,00
0-5
Advogado Sênior ( 7 a - anos)
7.000,00 - 12.000,00
0-2
9.000,00 - 16.000,00
0-4
10.000,00 - 18.000,00
0-5
Empresarial/M&A
Pequeno porte
Médio Porte / Boutique
Grande Porte
(CLT)
Bônus
(CLT)
Bônus
(CLT)
Bônus
Advogado Júnior ( 1 a 3 anos)
3.500,00 - 5.000,00
0-3
3.500,00 - 5.000,00
0-5
3.800,00 - 6.000,00
0-5
Advogado Pleno ( 4 a 7 anos)
5.000,00 - 7.500,00
0-3
6.000,00 - 9.000,00
0-5
6.000,00 - 11.000,00
0-5
Advogado Sênior ( 7 a - anos)
7.200,00 - 12.000,00
0-3
9.000,00 - 18.000,00
0-5
10.000,00 - 20.000,00
0-5
Imobiliário
Pequeno porte
Médio Porte / Boutique
Grande Porte
(CLT)
Bônus
(CLT)
Bônus
(CLT)
Bônus
Advogado Júnior ( 1 a 3 anos)
3.200,00 - 4.700,00
0-2
3.500,00 - 5.500,00
0-3
3.800,00 - 5.500,00
0-4
Advogado Pleno ( 4 a 7 anos)
4.000,00 - 6.500,00
0-2
5.500,00 - 9.000,00
0-3
5.500,00 - 9.000,00
0-4
Advogado Sênior ( 7 a - anos)
6.000,00 - 12.000,00
0-2
8.000,00 - 16.000,00
0-3
10.000,00 - 18.000,00
0-4
Mercado de Capitais
Pequeno porte
Médio Porte / Boutique
Grande Porte
(CLT)
Bônus
(CLT)
Bônus
(CLT)
Bônus
Advogado Júnior ( 1 a 3 anos)
4.000,00 - 6.000,00
0-5
4.000,00 - 6.000,00
0-6
Advogado Pleno ( 4 a 7 anos)
5.000,00 - 9.000,00
0-5
6.000,00 - 9.000,00
0-6
Advogado Sênior ( 7 a - anos)
9.000,00 - 18.000,00
0-5
9.000,00 - 20.000,00
0-6
Regulatório / Infraestrutura
Pequeno porte
Médio Porte / Boutique
Grande Porte
(CLT)
Bônus
(CLT)
Bônus
(CLT)
Bônus
Advogado Júnior ( 1 a 3 anos)
3.500,00 - 5.000,00
0-3
3.800,00 - 5.500,00
0-4
Advogado Pleno ( 4 a 7 anos)
5.000,00 - 8.500,00
0-3
6.000,00 - 10.000,00
0-4
Advogado Sênior ( 7 a - anos)
8.000,00 - 16.000,00
0-3
9.500,00 - 18.000,00
0-4
* O bônus se refere ao número de salários pagos

NOTAS:
[1] GALVÃO, Adriana Siqueira. O Advogado Empregado. Monografia apresentada em Curso de Especialização em Direito e processo do trabalho. Universidade Prebisteriana Mackenzie, Brasília, 2003, p.3.
[2] LOBO, Paulo Luiz Neto. Comentários ao Estatuto da Advocacia. Brasília: Brasília Jurídica, 1996. p. 100.
[3] DINIZ, Carlos Roberto Faleiros. O advogado empregado. Jornal Jus, n. 3, maio 2002. Disponível em: http://www.saaddiniz.com.br/pdf/3231630931120043119Advogado_Empregado_v2.pdf